Biscoito Caiubi
São Paulo, 27 de julho de 2024.
Biscoito Caiubi
Neste ou naquele tempo muito bom (Caiubi), talvez era o melhor, "se o tínhamos" nas dependências de casa não vem ao caso. O irmão caçula gostava muito (todos nós), aliás, como irmão mais velho e responsável por ele, entendia que deveria dar ao mocinho o prazer de desfrutar de uma bolacha, e a mais acessível seria àquela (dentro de uma das latas, na cozinha do fazendeiro).
O olhar desses incautos revelavam tudo (desejo, vontade), porém, não refletiam no papai e mamãe os porquês de tantos desejos (de nossos estômagos), apesar das condições nem tanto favoráveis, tanto de meios quanto de valores.
"Um pai" que preza(va) pelo certo e, por conta disso, requer de seus filhos atos e ações positivas (que o orgulhassem), mesmo não tendo nenhuma formação cultural aprendida num banco escolar (devido às dificuldades imensas e a necessidade de trabalhar - cuidar da família), entretanto a vida e seus pais (nossos avós) o ensinaram desde pequeno (sobre honestidade e caráter).
"Uma mãe" que além de doce era forte e valente, protetora de seus filhos, mas, não queria que eles tivessem atitudes negativas (e os desapontassem), assim sendo, por eles (papai e mamãe) não podíamos agir daquela forma. Diante disso, seria melhor ficarmos apenas na vontade e, numa outra oportunidade (futuro conquistado), adquirirmos de maneira correta.
Para contextualizar:
Morávamos numa fazenda, a qual nosso pai era o responsável (espécie de caseiro), no mesmo espaço (casa geminada) havia a residência dos patrões (quando vinham ali repousar por certo período). Uma vida muito simples, mas aconchegante. Naquele ambiente vivia o nosso papai, mamãe, irmão Paulo (trabalhava como vaqueiro), irmã Cléo, irmã Deuzinha, irmão Evaldo e eu, às vezes, recebíamos a visita da nossa irmã Maria (morava em São Paulo desde pequena - saíra bem novinha para trabalhar).
Ninguém nos apresentou o tal "biscoito caiubi", ou melhor, deu-o a nós. De longe, víamos alguém comê-lo (os donos da fazenda e seus filhos, sequer oferecia aos desejosos), visualizar aquilo não enchia as nossas barrigas, muito menos compensavam nossos olhos (sedentos), comê-lo seria o mais próximo de nossas vontades (realidade).
A questão era:
Como teríamos acesso a tais guloseimas?
Vejam como são as coisas:
Certo dia o patrão saiu (com o carro para algum lugar que não me recordo, só sei que não demorou muito), nessa oportunidade o mais novinho (irmão É) disse a mim:
“O 'Linquim' saiu e a porta não está trancada (casa dos chefes) e, ainda, sei onde estão as bolachas”, vamos lá pegar algumas para comermos?
Assim, nos aventuramos nessa empreitada. Ficamos algum tempo naquele local (comendo e guardando algumas nos pequenos bolsos de nossos shorts, algumas cairam ao chão). Esse ínterim foi suficiente para o retorno do 'senhor dono' e, consequentemente, sermos apanhado ali (dentro de sua casa, com o produto buscado).
Saímos de lá sem rumo! Só queríamos fugir daquele lugar e das vistas de nosso pai, uma vez que queria aplicar um corretivo nos filhos amados, assim fora em nosso encalço, correra ele atrás de nós (irmão mais novo e eu) até a subida de um monte (longe de suas vistas), que ficava a frente da entrada principal da fazenda, por lá permanecemos por longo período.
No distante local (morro), ficamos o dia inteiro, desde a manhãzinha, - pavorosos e com medo de tal correção, - ou pelo menos até passar a “raiva que dominara nosso patriarca”. Ao escurecer retornamos a casa, depois de ouvirmos a nossa querida mamãe nos chamado:
“Meninos, vem o pai de vocês não vai mais bater, pode descer”. Mesmo temendo, descemos e, realmente, não apanhamos.
Ainda hoje, papai disse:
“É assim que começa na ladroagem", referindo-se ao evento das "bolachas", lanchinho realizado na cozinha do patrão e também por levar um "tiquim" para mais tarde.
Ele quis corrigir (disciplinar-nos), no entanto, tivemos que correr, por conta disso ficamos o dia todo expostos aos perigos do mundo selvagem.
Sobre tudo isso, se errado ou não certo, aprendemos. Parece uma história “boba - inocente”, contudo foi muito marcante em nossas vidas (ainda hoje se comenta, se lembra), pois os olhares incrédulos (principalmente, dos de fora) achavam que seríamos personagens negativos no decorrer da vida.
Em suma, foi assim que aconteceu conosco (irmãos/filhos mais novos), isto é, mais um fato que ficou registrado em nossas memórias. Meninos inocentes que queriam apenas comer uma bolacha, pois era a Caiubi! Marca registrada nesse tipo de alimento. Situação ocorrida a quase quarenta anos, no entanto, parece tão recente. Hoje, torna-se apenas uma lembrança de tudo aquilo que aconteceu conosco. Caso seja um riso, à época um choro, um medo, uma incerteza.
NRC®
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